INTROSPEÇÃO

VIAGEM AO MEU INTERIOR

Era uma terça feira molhada e fria. Nem parecia inserida no contexto festivo do mês de dezembro! Era


dezembro. Mas não se ouvia qualquer “dingo bel”, “dingo bel”! Não se ouvia nada, além dos ruídos da chuva na janela. De repente, percebi que nada tinha para fazer. Nestes momentos, costumo dirigir-me ao quarto e lá ficar por horas, até que o sono venha, ou venha uma ideia que me faça levantar e agir seja no que for! Deitei me na cama, para esticar, e ao mesmo tempo, relaxar esse velho corpo, em outros tempos tão castigado! Pensei; mereço esse descanso!

No aconchego de meu quarto, os pensamentos me levavam a outros cantos menos monótonos e solitários. Foi quando passei a pensar nas viagens. Afinal já faz muito tempo que não faço uma grande viagem. (É claro que os conceitos de muito tempo e de grande viagem, ficam por conta da imaginação de cada um).

Pois bem, percebi que ultimamente tenho pensado e falado demasiadamente sobre viagens. Seja sobre curtas e rápidas viagens de dois ou três dias, sejam elas longas e cansativas, ou até mesmo as viagens no tempo, como recentemente escrevi, sobre minha vontade de voltar ao passado.

O fato é que estou me transformando em um maníaco por viagens. Então, desta vez, resolvi fazer uma viagem diferente. Porque, pior que a mesmice de nada fazer, é fazer sempre o que todos fazem, utilizando-se dos mesmos argumentos! Não. Eu me recuso a fazer tudo igual. Não aceito a comparação com as pessoas normais, embora isso, talvez seja o que se espera de uma pessoa normal. Mas, o que é ser normal?

Nesses tempos loucos, até a normalidade virou tema complexo. O debate sobre o que é normal, ainda não chegou ao parágrafo da conclusão. Patina, nas definições de normal, novo normal, antigo normal etc. Caberia facilmente no contexto da normalidade, cogitar o banimento dos dicionários, da palavra normal, para em seu lugar, entrar uma que possa conter um significado mais abrangente, por onde transitem as mais diversas nuances de experiências, fatos ou situações, sem suscitar qualquer tipo de estranheza!

Feitas as devidas ponderações, voltemos ao tema central.

Durante toda a minha vida, tenho viajado por muitos lugares, atendendo a variadas motivações que passam pelo lazer, pelas obrigações profissionais ou por outras necessidades e circunstâncias. Já experimentei diversos meios de locomoção, tais como: veículos movidos por tração animal, motos, carros, barcos e aviões. Já viajei pelo imaginário, partindo do futuro ao passado, quando pude rever antigos e saudosos amigos e pude reviver a sensação da tenra idade, onde o corpo atende a qualquer apelo da vontade e realiza com precisão, qualquer tarefa que se lhe imponha!

Mas, desta vez navegarei por outros caminhos. Neles, de tão estreitos, não se admite companhia. Então, viajarei sozinho. Meu destino é meu interior! Viajando comigo mesmo, e, estando em mim mesmo, reconheço diversas paisagens! Minha solidão às vezes me faz bem, porque me permite esta comunhão unitária, mas completa, concisa e esclarecedora! Eu sou um ser único, diferente de tudo. Igual, somente a mim mesmo! Talvez, nem isso, por que há momentos em que não me reconheço! Sou eu? O fato, é que não digo isso por ter  ouvido definições clássicas sobre a individualidade! Eu me sinto único.

Estava eu ali parado, sem fazer nada. De repente resolvi fazer uma autoanálise. Fazendo uma autoanálise, percebo que tenho estado obcecado por viagem.  E ao estar obcecado, preocupo-me, porque obsessão não é bom sinal. Estaria enlouquecendo? Caso esteja, é doce a loucura!

José Assunção da Silva

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